quinta-feira, 24 de julho de 2014

Pequeno comentário para um livro-quase

Também acho que cheguei atrasada no campeonato de suicídio. Afinal, estava marcado para algum horário? Havia de fato alguma hora marcada? Atrasar não seria  apenas uma outra forma de chegar na hora exata? Existe alguma precisão nesse estar na hora? Enfim... Esse papo que se desenha entre atrasar e estar na hora acaba e não acaba sendo uma tentativa medíocre de iniciar o impossível gesto de  dizer algo indizível: apalpar o inventar do vento que o último livro de André Monteiro apresenta. Sem pedir permissão ou licença aos mitos, fui tocada pelas sensações da mística do impreciso tempo-não impresso na leitura de cada poema-quase desse quase-livro, objeto-não e sim. Na verdade, bem contra-verdade,  um quase estado-de-corpo apresentado por entre dobras, brechas, esquinas e travessias.  Onde a vida grita no rasgo escuro das gentes. É a mais bela e a mais profunda e justa música de seu silêncio, navega o caminho das pedras e representa o irrepresentável. Talvez porque, diante do que André Monteiro escreve, não seja preciso escrever nada. Apenas cuidar da arte de saber ouvi-lo... Em sensações que nos passam pelas coisas, levam-nos a tirar a roupa, produzir o escândalo do corpo-texto, pré-texto e anti-texto. E a tristeza nada mais é do que essa ilusão de se estar imóvel diante de tanta carne viva.


Fabrícia Valle 
(poeta e mestre em Estudos Literários pela UFJF)

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